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Sunday, October 16, 2005

BIG NAMES 1990

90-10-24-nm=notícias do maravilhoso - chodrak


24-10-1990

A vedeta ao vivo, hoje, pelas 18 horas, na Faculdade de Letras de Lisboa, anfiteatro 1, a convite da associação de Estudantes, é o médico pessoal do Dalai Lama, Dr. Tenzin Chodrak.
Verdadeira «lenda» viva da resistência tibetana à ocupação chinesa, com um curriculum de militante em que se destacam 17 anos no pior campo de concentração da China Popular, o Dr. Chodrak irá falar sobre a medicina tradicional do seu país. Para quem souber o tibetano, tudo será fácil e claro na conferência de Chodrak. Para os menos habilitados nessa estranha língua dos Himalaias, um intérprete de inglês traduzirá o essencial. E para os menos letrados, Filipe Rocha, da Escola do Budismo Tibetano Nyingma, traduzirá do inglês para português chão.
Este será um encontro histórico: não só dos estudantes de Letras com o representante de uma civilização que provavelmente só conheceriam dos livros e terão interesse em ver ao natural; mas também porque não é todos os dias que a medicina tradicional tibetana nos é explicada por um dos seus mais abalizados representantes.
«Equilíbrio de todas as energias humanas» é o conceito chave da medicina que Chodrak pratica. «O principal - como ele disse a « A Capital» - é manter o equilíbrio entre o estado de espírito, o estilo de vida e a dieta». Aprender (e ensinar) a gerir as energias humanas é, assim, um dos objectivos que se propõe a medicina praticada há séculos nos mosteiros do Tibete.
«Tudo na medicina tibetana é simples e complexo» - afirma o dr. Chodrak, sublinhando assim a mais típica característica do processo iniciático (ou terapêutico), simples para quem está subindo já os degraus da escada, complicado para quem se arreganha, de fóra, a negar até que a escada exista.
Ninguém é obrigado a converter-se ao budismo ou ao hinduísmo para obter resultados práticos com as técnicas médicas da tradição esotérica tibetana. Mas isto é como o dinheiro no Ocidente e conforme se costuma dizer: praticar o Dharma não dá a felicidade nem garante a cura, mas ajuda muito. Não somos, pois, obrigados a crer em nada mas estamos obrigados - isso sim e como frisa o dr. Chodrak - a cuidar de nós mesmos, a pensar no nosso destino, saber porque estamos aqui, de onde viemos e para onde vamos.
E todos estes pontos têm a ver, na perspectiva iniciática (ou médico-terapêutica), com a nossa «doença», com o nosso «sofrimento», no sentido ao mesmo tempo mais lato e mais preciso destas palavras.
Como acentua Chodrak, a doença seria mesmo, na perspectiva da sabedoria mais antiga, uma espécie de teste transcendente para nos pôr à prova no sentido do nosso próprio progresso evolutivo à escala cósmica. Se a doença era e é um teste, é caso para concluir que essa oportunidade e função da doença foi completamente destruída por uma medicina cega que ignora os fundamentos do homem e a função gnóstica das suas actividades sensoriais e vitais.
«Muito importante - acentua ele - é o nosso estado de espírito, a nossa disposição em relação a todos os seres sensíveis. Normalmente e se fôssemos saudáveis, devíamos ter um estado de espírito concentrado no benefício de toda a gente e devíamos procurar evitar, de qualquer maneira, qualquer tipo de mal. Isso é a saúde.»

NO LIMITE DAS ENERGIAS HUMANAS

Desde os 21 anos médico pessoal do Dalai Lama, cuja saúde regularmente vigia através do diagnóstico dos pulsos, foi em 1959, com a entrada da China Comunista no Tibete, internado num campo de concentração, onde permaneceu, alvo das maiores torturas, até 1976, o que se afigura de facto sobrenatural. Mas tudo nele é humano, simplesmente humano.
Ser de excepção, forjado nos limites do sofrimento, Chodrak cumpriu pena de degredo no deserto de Gobi, uma das colónias penais mais sinistras da China Popular, onde esteve 16 anos resistindo a todas as torturas, enquanto via sucumbir companheiros seus. O facto de ter curado um alto dirigente chinês de uma doença dada como incurável pela medicina oficial, iria contribuir para o libertar, em 1976. Depois, começou a sua peregrinação pelo mundo. Fundou centros de medicina tibetana, não só na Índia (Dharamsala) - onde regularmente trabalha - mas em outros países como o Nepal e o Bhutão. Pela Europa e Estados Unidos, tem realizado conferências e colóquios, divulgando os pontos essenciais de uma sabedoria que, embora oculta, pode ser revelada a todos os que queiram entender o Dharma budista.

RIO DE VÁRIOS AFLUENTES

Ponto de encontro de três grandes correntes médicas - hindu, helénica (através da Pérsia) e chinesa (a mais antiga que se conhece), a medicina tibetana, que conseguiu ser preservada devido às condições geográficas do País, aparece hoje como um concentrado de técnicas que a experiência foi apurando e depurando. O seu estudo e aprofundamento, no entanto, só pode ser feito por quem domine a língua tibetana, já que os principais textos (tantras médicos) se encontram neste idioma e não foram ainda transladados para línguas ocidentais.
Um exemplo desse «pluralismo» da medicina tibetana, corrente aberta a outras correntes, é dado pelo dr. Chodrak e refere-se à farmacopeia vegetal do Tibete que funciona, evidentemente, como qualquer fitoterapia ocidental( extractos, decocções, pastilhas, pós) e funciona tanto melhor quanto mais profundamente se conhecer o sistema médico do Ayurveda, onde a tradição tibetana foi colher preciosos ensinamentos de farmacopeia.
Quando a homeopatia foi «descoberta» no Ocidente pelo médico alemão Samuel Hahnemann (1755-1843), a técnica da «potenciação» energética já existia e funcionava na Índia e no Tibete havia vários milénios ( não esqueçamos que cada milénio tem dez séculos...). Tal como aconteceu à Acupunctura, que a medicina ocidental adoptou e adaptou, desligando-a do seu contexto ou sistema original, também a terapia herbárea do Ayurveda, quando chegou ao Ocidente, sob a forma de fitoterapia ou de homeopatia, veio desligada do sistema coerente dentro do qual fazia sentido.

MEDICINA HUMANA

Como diz Terry Clifford, doutorada em Psicologia e Religião, autora de um livro sobre « A Arte de Curar no Budismo Tibetano» «The Diamond Healing» ( 1981), a medicina tibetana é predominantemente holística, quer dizer, «enfatiza a relação entre a mente e o corpo, entre o psicoorganismo concretizado e o Universo»; ela «envida esforços preventivos e curativos para manter e restaurar o equilíbrio cósmico, dentro e fora». Finalmente, «como a maioria dos sistemas médicos tradicionais, define a saúde em função do equilíbrio mas, nela, o conceito de equilíbrio é desenvolvido até aos limites mais distantes e subtis».
O Ocidente procurou alcançar esta meta humanista e «inventou» a medicina psicosomática, que ficou apenas e paradoxalmente nos livros dos respectivos especialistas, já que não se pratica e ninguém a pratica. Inclusive a psiquiatria transformou-se numa terapêutica de «específicos» químicos, levando a doença mental à paranóia da hiperespecialização e da hiperanálise. Ou seja, piorando a doença em vez de a curar.
O sentido «holístico» das terapêuticas como a tibetana vai assim no sentido inverso: valoriza tanto o Todo como a parte, mas vê esta indesligável do conjunto. Para isso, as tecnologias e os remédios têm que diferir da farmácia analítica em uso no Ocidente. O universo humano vive no e do todo, e não de cada parte de per si, por isso é sempre considerado na perspectiva do macrocosmos, para o qual se apela, aliás, no sentido de fazer convergir as mais poderosas energias circulantes sobre a pessoa humana que sofre e aspira à cura.
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